Em setembro de 2024, o Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, anunciou o primeiro corte nas taxas de juros desde o início da pandemia. Essa decisão é um marco significativo, e seus efeitos reverberam globalmente, especialmente em economias emergentes como o Brasil. Este corte nos juros americanos inaugura um novo ciclo de política monetária nos EUA, que promete influenciar fortemente os fluxos de capital e, consequentemente, o desempenho dos mercados emergentes, incluindo a bolsa de valores e a economia brasileira.
O efeito do corte de juros nos EUA no fluxo de capital para mercados emergentes
Historicamente, o corte de juros em países desenvolvidos, como os EUA, tende a redirecionar fluxos de capital para mercados emergentes. O motivo é simples: com a redução das taxas de juros americanas, os títulos de dívida dos EUA, como os treasuries, tornam-se menos atraentes para investidores globais, que começam a buscar alternativas mais rentáveis. Países como o Brasil, que apresentam juros mais altos, tornam-se destinos naturais para esses investimentos.
Nos últimos meses, a expectativa de que o Fed cortaria os juros já estava no radar dos investidores. O corte efetivo confirmou essas expectativas e deve fortalecer o movimento de alocação de capital estrangeiro em mercados emergentes. O Brasil, que já começou a experimentar uma entrada de recursos estrangeiros na sua bolsa de valores (B3), é um dos principais beneficiários dessa mudança.
De acordo com dados recentes, em julho de 2024, os investidores estrangeiros aportaram R$ 7,35 bilhões na B3, e em agosto, até o dia 15, já foram injetados R$ 4,06 bilhões. Este fluxo contribuiu significativamente para o desempenho positivo da bolsa e do real, com o Ibovespa registrando alta de 6% e o dólar caindo 4,2% no mesmo período.
Brasil: O atrativo das taxas de juros altas
Uma das principais razões que tornam o Brasil um destino atrativo para investidores internacionais é sua elevada taxa de juros real, considerada uma das mais altas do mundo. Embora o Brasil tenha iniciado recentemente seu ciclo de corte de juros, a taxa Selic, ainda em níveis elevados, mantém o país como um dos mais rentáveis para investidores que buscam retornos mais altos.
Atualmente, a taxa Selic está em 10,50% ao ano, enquanto a inflação anual está em torno de 4%, resultando em uma taxa de juros real significativamente alta. Esse diferencial entre a taxa de juros nominal e a inflação torna o Brasil extremamente atraente para investidores que buscam maximizar seus retornos. Comparado a economias desenvolvidas, onde as taxas de juros reais estão próximas de zero, o Brasil oferece oportunidades vantajosas para alocação de capital.
A alta taxa de juros do Brasil não só atrai investidores para o mercado de renda fixa, como também impulsiona o fluxo de capital para o mercado de ações. Com uma economia que apresenta sinais de recuperação, investidores estrangeiros enxergam oportunidades de crescimento no Brasil, especialmente em setores como commodities, infraestrutura e bancos. A combinação de um real desvalorizado e ações com preços atrativos faz com que o Ibovespa, em dólares, esteja longe de suas máximas históricas, oferecendo um “desconto” para os investidores estrangeiros.
A influência do corte de juros dos EUA no mercado de ações brasileiro
O corte de juros nos EUA não impacta apenas o mercado de dívida; ele também gera efeitos importantes no mercado de ações. Com menores retornos esperados em títulos americanos, investidores internacionais aumentam sua disposição para assumir riscos, e os mercados emergentes, como o Brasil, aparecem no radar como opções de maior retorno. Isso porque, quando os juros caem em economias desenvolvidas, o apetite por ativos mais arriscados cresce.
O Brasil, com uma economia que apresenta crescimento moderado e expectativas revisadas para cima, e empresas que, em sua maioria, conseguiram se adaptar bem às condições adversas dos últimos anos, surge como uma alternativa atrativa para os investidores. A recente temporada de balanços mostrou que muitas empresas brasileiras estão preparadas para uma retomada, e isso adiciona um atrativo extra para os investidores estrangeiros que buscam por oportunidades de crescimento a preços acessíveis.
Com a entrada de capital estrangeiro, o mercado acionário brasileiro tende a se beneficiar diretamente. Empresas de setores como commodities, bancos e infraestrutura, que são os primeiros destinos naturais desse capital, podem experimentar uma valorização significativa de suas ações. Além disso, com o aumento da liquidez no mercado, setores mais voláteis, como o varejo e o imobiliário, também podem se beneficiar em um segundo momento.
Em termos de números, o Ibovespa já tem mostrado sinais de recuperação. Segundo dados da B3, após seis meses consecutivos de saída de capital estrangeiro, o terceiro trimestre de 2024 caminha para ser o primeiro de entradas líquidas, com R$ 11,40 bilhões de saldo positivo, contrastando com as saídas líquidas de R$ 21,9 bilhões no primeiro trimestre e R$ 16,96 bilhões no segundo. Essa injeção de capital tem sido fundamental para o desempenho positivo da bolsa, e o corte de juros nos EUA pode acelerar ainda mais esse processo.
O impacto do real desvalorizado e da bolsa brasileira descontada
Outro fator que reforça o apelo do Brasil como destino para capital estrangeiro é o fato de que o real, apesar de sua recente valorização frente ao dólar, ainda está desvalorizado em relação ao seu poder de compra pré-pandemia. Desde o início da pandemia de Covid-19, o real perdeu significativamente seu valor frente ao dólar, o que aumenta a atratividade dos ativos brasileiros para investidores internacionais que compram ações em reais.
Além disso, a bolsa brasileira ainda está descontada em comparação com outros mercados emergentes e com sua própria média histórica. Em termos de dólar, o Ibovespa está em pouco acima dos 25 mil pontos, distante de sua máxima histórica de 45 mil pontos em 2009. Essa desvalorização do índice, somada a uma expectativa de crescimento econômico revisada para cima, cria um cenário ideal para que investidores estrangeiros vejam no Brasil uma oportunidade de entrada com preços acessíveis e boas perspectivas de retorno no médio prazo.
Riscos e oportunidades no horizonte
Embora o cenário atual seja positivo para o Brasil, com a expectativa de entrada de capital estrangeiro impulsionada pelo corte de juros nos EUA, é importante lembrar que há riscos associados a esse fluxo. O mercado financeiro é volátil e suscetível a mudanças abruptas na política monetária global.
No Brasil, o elevado endividamento público e o déficit fiscal contínuo podem gerar incerteza quanto à capacidade do governo brasileiro de manter a disciplina fiscal a longo prazo. Deve-se considerar ainda que caso o FED decida mudar sua postura e interromper o ciclo de corte de juros, ou se o cenário econômico dos EUA melhorar de forma inesperada, o fluxo de capital pode reverter rapidamente, levando a uma saída abrupta de recursos do Brasil.
Além disso, o cenário geopolítico global permanece instável. Conflitos como a guerra na Ucrânia e as tensões no Oriente Médio podem criar incertezas e volatilidade nos mercados, afetando diretamente os países emergentes. Embora o ambiente global pareça relativamente estabilizado em comparação aos meses anteriores, esses riscos não podem ser ignorados.
Ainda assim, para o Brasil, o cenário atual representa uma oportunidade única de atrair capital estrangeiro, fortalecer seu mercado acionário e melhorar suas perspectivas econômicas. Se o fluxo de capital continuar, as ações brasileiras poderão se beneficiar significativamente, com setores como bancos, commodities e infraestrutura liderando a valorização.
Conclusão
O corte de juros nos EUA marca o início de um novo ciclo que deve beneficiar fortemente os mercados emergentes, especialmente o Brasil. Com uma das maiores taxas de juros reais do mundo e uma bolsa descontada, o Brasil se apresenta como um destino atraente para o capital estrangeiro. Esse fluxo de recursos tem potencial para impulsionar o mercado de ações brasileiro e fortalecer a economia do país no médio prazo.
Entretanto, é importante que os investidores considerem os riscos associados, como a volatilidade do cenário geopolítico e possíveis mudanças abruptas na política monetária dos EUA. Mantendo-se o atual cenário, o Brasil pode se beneficiar de uma entrada significativa de capital estrangeiro, criando oportunidades de crescimento para o mercado acionário e a economia nacional.